Autismo é 'campeão' de PLs no Congresso, mas violação de direitos amplia judicialização

Autismo é o tema 'campeão' de projetos de lei no Congresso Nacional, segundo informações do relatório da Frente Parlamentar Mista pela Promoção da Saúde Mental usado na construção da Agenda Legislativa 2025/2026.

Foto de AT Noticias Por AT Noticias
15/04/2025 às 07:55:40 - Atualizado há

Foto: Estadão
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Autismo é o tema 'campeão' de projetos de lei no Congresso Nacional, segundo informações do relatório da Frente Parlamentar Mista pela Promoção da Saúde Mental usado na construção da Agenda Legislativa 2025/2026. São 278 PLs em tramitação, sendo 22 no Senado e 256 na Câmara. O documento está publicado no website da FPSM.

Para comparação, o segundo assunto com mais propostas é 'suicídio' (43 projetos), seguido de bullying (42 PLs).

Apesar do atual interesse dos parlamentares nas temáticas do autismo, ainda há uma violação constante de direitos garantidos aos autistas, principalmente na área da saúde, o que leva ao aumento contínuo da judicialização.

Uma pesquisa simples na página do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (TJSP) mostra que, entre 10/4/2024 e 9/4/2025, foram 5.588 acórdãos relacionados o Transtorno do Espectro Autista (TEA) e planos de saúde, um crescimento de 50% em relação ao mesmo período de 2023/2024, quando houve 3.723 acórdãos.


Acórdãos - TJSP

Autismo / Planos de Saúde

5.588 (2024/2025)

3.723 (2023/2024)

2.961 (2022/2023)

2.244 (2021/2022)

1.486 (2020/2021)


Esse aumento gera preocupação no judiciário. Para o presidente da Associação dos Procuradores do Estado de São Paulo (APESP), José Luiz Souza de Moraes, não se deve defender a judicialização como regra porque é o administrador público quem detém legitimidade para definir políticas públicas, com base em dados, orçamentos e prioridades coletivas.

"O Judiciário tem como missão corrigir distorções, especialmente quando políticas públicas deixam de garantir direitos fundamentais. O problema é que, ao decidir sobre demandas específicas, o juiz tem uma 'visão de túnel', ou seja, enxerga apenas o caso concreto, sem considerar o impacto sistêmico de sua decisão. O gestor público, ao contrário, precisa analisar o todo: múltiplos programas, recursos limitados e necessidades diversas", diz.

"No contexto do TEA, essa tensão é evidente. O acesso a tratamentos específicos, fonoaudiologia, psicopedagogia e transporte escolar adaptado, por exemplo, muitas vezes é conquistado por meio da judicialização. Isso revela o quão deficiente ainda é a oferta pública de um cuidado transversal e estruturado. O autismo não diz respeito apenas à saúde, mas educação, assistência social, mobilidade urbana e inclusão produtiva. Exige, portanto, políticas públicas construídas com olhar global e intersetorial", afirma.

"A judicialização da saúde é um fenômeno crescente no Brasil, ainda mais aguda quando falamos de ações visando o tratamento do Transtorno do Espectro Autista. Isso ocorre de forma mais acentuada no TEA, justamente em razão da pluralidade dos tratamentos e também dos crescentes diagnósticos desse transtorno, feitos cada vez mais cedo, e pela complexidade dos tratamentos", comenta o procurador.

"O problema é que alguns desses tratamentos não gozam de eficácia e segurança comprovadas, o que coloca, inclusive, em risco os próprios pacientes", ressalta.

O presidente da APESP afirma que a judicialização não é só ruim, porque também ajuda na constru de uma políticas públicas. "Por sua complexidade, o problema depende da atuação conjunta de diversas secretarias, como educação, saúde, proteção à pessoa com deficiência e até segurança pública e acesso à Justiça", mas o especialista reconhece que há um aspecto "muito negativo", a possibilidade de fraudes "na judicialização de tratamentos, de medicamentos e de posturas que não contam com a eficácia e com segurança comprovada, mas já que o judiciário é impelido a atuar na criação dessa política pública e na supressão das falhas das políticas públicas existentes, há fraudes na judicialização, o que deve ser combatido de todas as formas, com muito rigor, porque além de vitimarem os próprios pacientes, vitimizam também todo o sistema público de saúde", diz.

Para o procurador, por existirem atualmente formas mais modernas e eficazes de diagnosticar o autismo, há a um crescente número de casos confirmados e de pessoas que judicializam o acesso a tratamentos. "Está evidente nos últimos anos em que os números crescem em uma projeção geométrica e estão assustadoramente em aceleração em todo o Brasil. Há também a pressão da sociedade para a criação de novas políticas públicas, o que nós percebemos com a aceleração também de criação de normas jurídicas que protegem a toda a população com TEA. Além disso, também há uma maior conscientização social a esse respeito, o que se mostra muito positivo".

blog Vencer Limites - A judicialização é uma realidade e quase sempre a única possibilidade de avanço para famílias de autistas que precisam de tratamentos complexos e contínuos, tanto na saúde pública quanto no setor privado (suplementar). Esse cenário não é resultado de um problema estrutural construído propositadamente, ou seja, de uma estratégia de negação dos tratamentos como padrão de ação e a preferência pela batalha jurídica, com cálculos sobre qual saída é menos onerosa?

José Luiz Souza de Moraes, presidente da Associação dos Procuradores do Estado de São Paulo (APESP) - Não. A judicialização da saúde, inclusive no que se refere ao transtorno do espectro autista, decorre de múltiplos fatores, entre eles a expansão do conceito de direito à saúde, a evolução das demandas individuais, a ausência de protocolos clínicos consensuais em determinadas terapias e a pressão legítima da sociedade civil. Não há qualquer estratégia estatal deliberada de negação de tratamentos. O que existe é a dificuldade concreta -- técnica, orçamentária e logística -- de responder a uma crescente e diversificada demanda com recursos escassos. O litígio judicial, quando necessário, não decorre de cálculo de conveniência, mas sim da complexidade do tema e de crescentes exigências e pluralidade de tratamentos

blog Vencer Limites - Há incentivo do setor jurídico à judicialização na saúde para ampliar lucros financeiros?

José Luiz Souza de Moraes, presidente da Associação dos Procuradores do Estado de São Paulo (APESP) - Infelizmente, há escritórios especializados, prestadores de serviços e até fornecedores de insumos médicos que, em certos casos, instrumentalizam o Poder Judiciário para a obtenção de lucros utilizando a via judicial como estratégia de faturamento. Isso ocorre, por exemplo, quando há padronização de pedidos, utilização de laudos sem base científica robusta ou indução de demandas em massa sem adequada análise individual. Temos que ter como meta, apenas utilizarmos tratamentos de eficácia Temos que ter como meta, apenas utilizarmos tratamentos de eficácia comprovada. e segurança comprovada. Contudo, é preciso evitar generalizações: a judicialização é também, muitas vezes, uma ferramenta legítima de acesso a direitos, e o Poder Judiciário cumpre papel essencial de controle e fiscalização das políticas públicas. O combate ao uso distorcido da via judicial deve ser técnico, com apoio de pareceres científicos, Núcleos de Apoio Técnico (NATs) e atuação proativa da advocacia pública. mas também cabe ao poder judiciário, não aceitar tratamentos de elevadíssimo custo sem qualquer comprovação de sua eficácia, apenas se rendendo às alegações das partes, que sempre são extremamente tocantes.

blog Vencer Limites - Autismo se tornou bandeira habitual na política, o que está refletido na grande quantidade de projetos de lei sobre o tema. Também é uma 'marca' de ativismo nas redes sociais. Vemos hoje o mesmo oportunismo que havia anos atrás com a Síndrome de Down, quando qualquer ação supostamente inclusiva tinha essa condição como símbolo. O aumento constante da judicialização seria um dos resultados desse oportunismo?

José Luiz Souza de Moraes, presidente da Associação dos Procuradores do Estado de São Paulo (APESP) - Acredito ser. É incorreto atribuir exclusivamente à "bandeira" política o aumento da judicialização. Ela resulta de uma combinação de fatores: aumento do diagnóstico, ampliação do acesso à informação, ausência de consensos terapêuticos e deficiências reais no sistema público e suplementar de saúde. O desafio é garantir políticas públicas baseadas em evidência científica e com sustentabilidade a longo prazo.

blog Vencer Limites - A desinformação nas redes sociais, nos aplicativos de mensagens e até na imprensa também atinge o universo legal? Como isso prejudica o avanço das políticas públicas?

José Luiz Souza de Moraes, presidente da Associação dos Procuradores do Estado de São Paulo (APESP) - Quando decisões judiciais se fundamentam em narrativas não técnicas ou em informações distorcidas -- como terapias sem comprovação científica ou diagnósticos não reconhecidos pelos órgãos de saúde --, compromete-se a efetividade do SUS e a isonomia no acesso ao tratamento. A judicialização baseada em desinformação gera decisões que, embora bem-intencionadas, podem prejudicar a coletividade, ao direcionar recursos a tratamentos ineficazes ou não prioritários. Além disso, ela desorganiza o planejamento estatal e dificulta a implementação de políticas universais. O importante é termos empatia, diagnósticos e tratamento precoce dos sintomas e uma constante informação da sociedade a respeito do TEA.


Ouça todos os episódios da coluna Vencer Limites no Jornal Eldorado (Rádio Eldorado)


Fonte: Nacional
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